Cotidiano, imaginação e paisagem
Galeria Estação, 20 anos
Cotidiano, imaginação e paisagem
Galeria Estação, 20 anos
Sobre
A presente exposição celebra a atuação da colecionadora e galerista Vilma Eid, que nas últimas duas décadas tem se dedicado a apresentar ao público artistas brasileiros por muito tempo subvalorizados por não pertencerem ao cânone erudito da história da arte. Trata-se, em geral, de homens e mulheres de origem modesta, que desenvolveram seus trabalhos artísticos de maneira autodidata e longe dos grandes centros urbanos, criando um universo imaginativo próprio a partir da vivência da cultura popular, das atividades laborais tradicionais e da religiosidade.
Tais artistas nem sempre ficaram fora dos museus e grandes exposições, como é o caso do paulista José Antonio da Silva (1909-1996), cujo reconhecimento se deu muito cedo, nos anos 1940, quando o então diretor do Museu de Arte de São Paulo, Pietro Maria Bardi, adquire suas pinturas para a coleção da instituição. No entanto, se Silva é figura recorrente nas narrativas da história da arte moderna brasileira, nem sempre seus trabalhos atingem valorização semelhante aos de seus contemporâneos. A importância da Galeria Estação no cenário da arte nacional está relacionada à revalorização, ou mesmo descoberta, de criadores que permaneceram à margem do sistema institucionalizado da arte, mas cujas obras são de uma contemporaneidade inquestionável.
Esta seleção buscou apresentar um conjunto significativo de pinturas e esculturas de oito artistas históricos no âmbito da dita arte “popular” ou “não erudita”, e que fazem parte do acervo da galeria. Para além dos questionamentos teóricos que essas classificações conceituais engendram, deseja-se evidenciar a riqueza formal e a autenticidade estilística do trabalho desses criadores, cuja presença se espalha pelo território brasileiro e que, em alguns casos, acabaram por inaugurar escolas artísticas regionais, como Antonio Poteiro ou Izabel Mendes da Cunha.
Por um lado, há similaridade no que diz respeito ao conteúdo temático das obras, com a presença marcante da relação entre o homem e o meio natural, do trabalho rural, do artesanato, das figuras religiosas e do imaginário das festas populares. Por outro lado, nota-se a singularidade expressiva que cada artista dá à vivência cotidiana de um universo comum. Também no que diz respeito ao uso dos materiais, como a madeira, por Zé Bezerra e Nino, ou o barro, por Noemisa e Izabel, materialidades com função central na constituição de suas poéticas, o processo de formalização das obras é completamente original.
Do conjunto, as pinturas de Mirian Inês da Silva e Júlio Martins destacam-se pela convivência que ambos tiveram com o meio cultural do Rio de Janeiro, produzindo um trânsito instigante de referências que fica como um convite a futuras pesquisas.
Ao aproximar esses trabalhos no espaço expositivo, intenta-se evidenciar a diversidade de uma produção que escapa a generalizações simplistas. Por fim, só temos a agradecer à atuação obstinada de Vilma Eid na preservação e conservação da memória da arte brasileira, e por sua generosidade ao expandir o conhecimento público dessas criações.